Com sobrinho soterrado e irmãos na UTI, sobrevivente diz ter visto a morte

Cinco homens da mesma família trabalhavam na obra que desabou em SP.
Grupo veio de ônibus: acidente ocorreu 16 dias após saída do MA.


Três irmãos e dois sobrinhos de uma família do Maranhão viram o sonho de fazer a vida na capital paulista virar tragédia. Por R$ 750 para cada 15 dias de trabalho, enfrentaram três dias de viagem de ônibus. Não tinham recebido o primeiro salário quando o imóvel onde trabalhavam, na Zona Leste de São Paulo, desabou. "Eu vi a morte na minha frente", conta Gilson Teixeira Silva, de 30 anos. Nesta quarta-feira (28), o sobrevivente passou o dia esperando notícia de dois irmãos que estão em estado grave na UTI e de um sobrinho, que estava desaparecido sob os escombros até o fim desta tarde.
A família de Joselândia, interior do Maranhão, chegou à capital paulista no último dia 11 de agosto. Gilson e os irmãos Antônio Nilson, de 27, Ralisson, de 22 anos, e os sobrinhos Antônio Alisson e Antônio Welington Teixeira Silva, começaram a trabalhar no dia seguinte na obra da loja localizada na Avenida Mateo Bei.
Quatro deles ficaram feridos na tragédia. Dois estão internados na UTI do Hospital Santa Marcelina, na Zona Leste da capital, em estado grave. Antonio Wellington continuava desaparecido sob os escombros.

De família simples, Gilson, o único que teve alta, diz que não tem nem dinheiro para a passagem de ônibus. Passou a quarta-feira (28) no hospital acompanhando a cirurgia do irmão Antônio após visitar o outro irmão, Ralisson, que teve o pé esquerdo amputado e continua na UTI.

"A gente nunca imaginaria que isso podia acontecer. Viemos com apenas uma malinha pequena, com poucas roupas. Deixei minha mulher e minha filha de cinco anos lá. Antônio tem uma filha de só 8 meses. Deus queira que eles saiam bem dessa", conta ele, em entrevista exclusiva ao G1 na ala cirúrgica do hospital.

Gilson ficou soterrado sobre lajes no desabamento e começou a gritar pelos irmãos. Ele atribuiu à falta de estrutura e pilares finos e "tortos" o desabamento. “Brincávamos que os pilares do centro, que seguravam a estrutura, eram muito finos. Todo mundo percebia. Tinha uns tortos. Mas nunca imaginávamos que podia acontecer alguma coisa", conta Jocimar, que sofreu uma panacada nas costas e escoriações nas pernas e braços, e ainda sente dores.

Gilson, Antonio e Ralisson possuem mais outros cinco irmãos homens. Os sobrinhos são filhos do mais velho, Francisco, de 38 anos.
Não dá para saber se a gente não tivesse vindo (do Maranhão) se algo teria acontecido ou não. Se algo tem que acontecer, acontece. Mas se meus irmãos tiverem alta, vamos voltar todos para o Maranhão. Não queremos ficar mais aqui.
Gilson Teixeira Silva
“Quando tudo desabou ouvimos um estrondo, uma laje caiu sobre as minhas costas e não consegui enxergar mais nada. Neste momento, eu e um parceiro estávamos reforçando um pilar, deslocando sacos de areia. Ele começou a gritar e eu também", diz ele.

O pedreiro lembra que respondeu ao grito do colega e que ele segurou sua mão, puxando-o. "Consegui me desvencilhar dos pedaços de pedra e me arrastei até conseguir sair", relembra. Jocimar tem uma filha de cinco anos. "Debaixo da laje, pensei que ia morrer. Pensei: 'Meu Deus, minha filha não pode ficar sem pai", diz. "Senti que eu vi a morte na minha frente", disse.

Ao ser atendindo pelo Samu, Gilson se mostrou desesperado. “Meus dois irmãos estavam soterrados, eu não podia sair de lá, mas me levaram para o hospital". Ralisson foi um dos últimos a serem retirados pelos bombeiros no início da tarde de terça-feira (27). Ele estava nos fundos da obra e foi levado de helicóptero Águia, da PM, ao Hospital Santa Marcelina, onde continua na UTI.
“Conversei com ele hoje, está lúcido. Mas ainda não tem previsão de alta. Nossa preocupação é com a família que está no Maranhão. Nossas mulheres querem vir, mas não há nem onde ficar", desabafa.
Pagamento: R$ 750 por quinzena
A construtora responsável pela obra iria pagar R$ 750 por quinzena a cada um dos operários, mas, diz Gilson, o salário estava atrasado. “Começamos a trabalhar dia 12 e dia 15 eles deveriam fazer o primeiro pagamento, mas não recebemos nada. Estou aqui em São Paulosem dinheiro e preocupado, porque depois de amanhã já completa a segunda quinzena e não sei se vamos receber. A empresa não nos procurou, não sabemos o que vai acontecer”, disse.

“Não dá para saber se a gente não tivesse vindo se algo teria acontecido ou não. Se algo tem que acontecer, acontece. Mas se meus irmãos tiverem alta, vamos voltar todos para o Maranhão. Não queremos ficar mais (em São Paulo)", afirma.
Um dos sobrinhos, Antônio Alisson, sofreu escoriações no desabamento, mas se recusou a ir para o hospital. Ele procurava pelo irmão, que estava desaparecido até a tarde desta quarta-feira. Os dois sobrinhos são filhos do irmão mais velho da família, Francisco, de 38 anos.

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